220. Cataclismo na Venezuela

Em nosso último texto percebemos o quão complexa é a história da Venezuela. Neste post iremos abordar o atual período do país, que teve início após um polêmico cidadão chegar ao poder.

Chávez

Em 1992, frente a um país pobre e desigual, o então tenente-coronel do exército, Hugo Chávez, tentou um golpe de Estado. Liderando cerca de 300 homens ele promoveu uma ação militar para retirar o presidente Carlos Andrés Perez do poder. O mesmo que, com ideias neoliberais, mergulhou o país em mais uma crise.

Essa tentativa foi um desenrolar do “Caracazo” ocorrido 3 anos antes, quando uma multidão foi as ruas reclamar do governo, sendo duramente reprimida pela polícia. Vejam como os protestos de 1989 foram violentos no site Youtube. 

O “Caracaço” foi uma explosão social espontânea, gigantesca, ocorrida em Caracas, no dia 27 de fevereiro de 1989. Imagem: Internet

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Liderando somente 10% das forças armadas, as forças rebeldes foram rapidamente dominado pelas tropas ainda leais ao governo.

Mesmo não conseguindo seu objetivo, o coronel teve seu minuto de fama. O Movimento Bolivariano¹ Revolucionário 200 (MBR-200) deu a ele a oportunidade de falar para a população.  Em seu discurso, enfatizou a necessária mudança e um futuro melhor, antes de ser conduzido a prisão.

Dessa forma, Chávez acabou se tornando um símbolo da luta contra a desigualdade e um governo corrupto e ineficiente.

A tentativa de golpe falhou, mas colocou Hugo Chávez na mídia venezuelana. Imagem: Internet.

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Em 1995 o coronel saiu da prisão e ingressou no campo político. Com um discurso forte, disputou as eleições de 1998, sendo eleito presidente com 56,2% dos votos, contra 39,97% de seu adversário, apoiado pelo governo da época.

Era a quebra do status quo.

As mangas de fora

Em seu primeiro ano de mandato Chávez já deu o seu recado, convocando um referendo para fazer uma nova assembleia constituinte e permitir a reeleição. As duas perguntas foram aprovadas pelo povo, com 87,75% e  81,74%, respectivamente.

Ainda em 1999 Chávez conseguiu, com o apoio dos deputados eleitos, majoritariamente fieis a ele, a subordinação da justiça ao poder executivo.

A grande verdade é que ele chegou ao poder de forma democrática e, tomando posse, traçou um caminho completamente autoritário.

No ano 2000, aproveitando de sua popularidade inicial, trazendo de reboque vários deputados leais a ele, a Assembleia Nacional aprovou a lei Habilitante, que permitia governar o país através de decretos presidenciais, sem precisar de votações no legislativo.

É incrível imaginar que deputados aprovem uma lei que permite a um presidente governar sem a anuência deles, os representantes do povo.

Lula, presidente do Brasil na época, ao lado de Chávez (2003). Por terem viés de esquerda, os dois presidentes tinham uma relação próxima, com o brasileiro sempre fechando o olho para os desmandos do vizinho. Imagem: Internet.

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Chávez reformou as leis em relação as propriedades rurais, a pesca e os hidrocarbonetos. O ponto alto foi a troca de toda a diretoria da estatal petrolífera PDVSA, a base do governo chavista.

Os poderosos, alijados do poder, tentaram um golpe em 2002, que durou alguns dias.  Ninguém bate de frente com a burguesia dominante sem que haja alguma retaliação. Após alguns dias de incertezas, as forças leais a Chávez conseguiram o retorno do presidente, agora ainda mais popular.

Apoiadores ao lado de Chávez em seu retorno ao palácio de Miraflores, em Caracas. Apesar dos desmandos, o coronel abriu guerra contra os latifúndios, algo que esse blog compreende e apoia, desde que a terra esteja improdutiva. Saiba mais em Brasil de Fato.

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A partir desse momento, a democracia que cambaleava foi assassinada no país. Enquanto a oposição, apoiada pelos EUA, promovia greves e desabastecimento, o governo Chávez caçava licenças de órgãos de imprensa e estatizava empresas.

O país rachou, algo relativamente parecido com o que vem ocorrendo no Brasil hoje, só que em um nível muito mais avassalador. Como sempre acontece, quem mais sentiu a  queda de braço foi o povo, vítima dos desmandos do governo e dos boicotes da oposição.

Com o forte aumento dos preços do petróleo, Chávez avançava em ações sociais, levando saúde e educação aos mais pobres através das chamadas “missões”.

Propaganda atual com uma imagem de Chavez, em uma refinaria da PDVSA. O petróleo é a base das políticas assistencialistas da Venezuela. Imagem: Internet.

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Não podemos ser maniqueístas e tratar o governo chavista como bom ou ruim. É inegável a melhora venezuelana em todos os índices de educação e saúde. Por outro lado, a democracia foi engolida para tal.

Morte de Chavez e Maduro

Em 2013 o líder bolivariano morreu vítima de um câncer. Até da sua doença ele fez uso político, dizendo suspeitar que foi algo implantado pela CIA norte-americana.

As eleições daquele ano já foram um alerta da guerra que viria mais a frente. Nicolás Maduro, ex-motorista de ônibus e sindicalista, discípulo de Chávez, venceu com 50,66% dos votos, frente 49,07%  de Henrique Capriles.

Maduro nem de longe lembra seu antecessor e padrinho. Imagem: Internet.

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O bolivarianismo continuaria na Venezuela, entretanto, a margem mínima da vitória já era o prenúncio de um cataclismo que atingiria o país mais a frente.

Sem o mesmo carisma de Chávez, com uma oposição ferrenha e completamente tosco no trato político, Maduro nem de perto lembra o antecessor. O golpe de misericórdia veio com a queda brutal dos preços do petróleo, tema já analisado em nosso blog em seu primeiro texto.

O óleo negro representa 95% das receitas do país. Atualmente o preço está se elevando, entretanto, passou por um período de queda significativa. O preço do barril que chegou a 120 dólares em 2008, caiu para menos de 50 dólares em 2014. Um país onde o governo estatizou várias empresas, com forte assistencialismo social, não conseguiu suportar uma diminuição de arrecadação deste tamanho.

Chamamos essa situação de Doença Holandesa², quando um país não se industrializa por estar completamente focado em uma única commodity para exportação. Também existem estudiosos que chamam de  “Maldição do Petróleo”, já que vários países detentores do óleo não diversificam suas economias, se tornando completamente dependentes do mesmo.

Miséria

A inflação no país é atualmente de 800% ao ano. Em uma tentativa de conter a alta dos preços, Maduro utilizou a mesma técnica de Chávez, congelando os preços. Esse expediente  desestimulou completamente os investimentos privados no país, provocando forte desabastecimento.

Abaixo, duas fotos, a primeira nos mostra apoiadores de Maduro, com a já manjada frase culpando os EUA pelos problemas do país. A segunda nos mostra manifestantes contra o regime. Imagens: Internet.

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Com desemprego em alta, apagões elétricos, falta de alimentos, remédios, água e uma população dividida, a violência explodiu no país, detentor dos mais altos índices de homicídios da América Latina em 2017. Foram 26.616 assassinatos no ano passado, metade que no Brasil, só que em uma população 6,5 vezes menor.

Os protestos de ruas estão cada vez mais violentos, com centenas de mortes. Imagem: Internet.

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Durante os governos Lula e Dilma nosso país manteve estreita relação com o governo ditatorial de Chávez, algo que se inverteu no governo Temer. Inclusive a Venezuela chegou a entrar no Mercosul, sendo muito bem-vinda naquela época. Atualmente, está suspensa do bloco. Outro aspecto importante é o fato da Venezuela estar passando por inúmeras sanções dos EUA, menos na área de petróleo, que logicamente interessa aos yankees.

Interessante também é perceber o ódio seletivo da turma do Trump. Para eles, a Venezuela é uma ditadura, o que concordamos, mas fecham contratos bilionários com a Arábia Saudita, um governo tão opressor quanto.

O próximo governante do Brasil terá a missão de lidar com esses problemas, já que milhares de venezuelanos estão migrando para cá nos últimos meses, criando uma situação insustentável  ao pobre estado de Roraima, na divisa com nosso vizinho.

Segundo a ONU, cerca de 2,3 milhões de venezuelanos já migraram do país, dado que confirma a situação caótica do país. Um problema que caminha para o mesmo patamar da crise de refugiados no Mediterrâneo, leia mais no site da BBC. 

Em 18.08.2018 um grupo de brasileiros incendiou os pertences de venezuelanos, devido a uma suposta agressão deles a um brasileiro. Leia a matéria completa no site G1.

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A oposição também não ajuda, boicotando todas as ações do governo, no melhor estilo quanto pior melhor.

Em 20 de maio de 2018 Maduro foi reeleito para um novo mandato de 6 anos, em uma eleição marcada por fortes indícios de fraude e uma abstenção de 54%. Dos cerca de 20,5 milhões de eleitores aptos  para votar, somente 8,6 milhões foram as urnas. Isso demonstra o gigantesco descaso e desconfiança em relação ao pleito.

Nosso blog está atento para os acontecimentos. A situação é bem complicado e sem solução a curto prazo.

Apesar das inúmeras críticas feitas ao socialismo, a crise na Venezuela está muito mais ligada a ditadura imposta por Chavez/Maduro e consequente revide da oposição. Além disso, temos uma forte burguesia que concentra renda e a nítida interferência dos EUA. É um país historicamente conturbado, onde golpes se tornaram uma constante ao longo dos séculos XX e XXI.

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1 – Bolivarianismo: É uma doutrina política utilizada por Hugo Chávez na Venezuela, remetendo a Simón Bolívar, líder da libertação das colônias espanholas na América. Tem como base a integração dos países latino-americanos, socialistas e não subjugados pelas potências desenvolvidas, em especial, os EUA.

2 – Doença Holandesa: O termo surgiu nas décadas de 1960/70, quando a Holanda descobriu enormes reservas de gás natural. O que deveria ser algo positivo pro país se tornou um problema. Com as expressivas exportações da energia, a moeda holandesa se valorizou muito, prejudicando a indústria do país, que se tornou pouco competitiva frente a outras nações. Isso gerou mais desemprego e baixo crescimento.

Publicado em 15.10.2019

 

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