Possivelmente, o episódio mais efêmero e exótico da história política brasileira foi o governo de Jânio Quadros. Eleito para um mandato de cinco anos, sequer conseguiu dar uma volta completa ao redor do sol, renunciando antes de completar 7 meses no cargo (31 de janeiro a 25 de agosto de 1961). Vamos entender melhor o que se passou nesse conturbado Brasil do início da década de 1960. Não muito diferente de hoje.
Eleições
As eleições de 1960 foram as últimas antes do golpe militar. O governo que havia acabado, de JK, modernizou bastante o Brasil, porém, deixou como herança, uma dívida externa em crescimento e uma inflação de 35% ao ano. Somado a estes problemas, denúncias de corrupção eclodiam por toda parte, principalmente ligadas a construção de Brasília. Apesar de tais indícios nunca terem sido comprovados.
Foram as primeiras eleições com propagandas eleitorais transmitidas pela TV e Jânio Quadros, lançado pelo pequeno PTN em coligação com a UDN, soube se aproveitar muito bem da situação. Tendo sido vereador e prefeito da cidade de São Paulo, posteriormente governador do estado, despontou como um sujeito simples que combatia a corrupção.
O jingle de sua campanha se baseava em uma vassoura, com o lema de limpar o Brasil: “Varre, varre, varre, varre, / Varre, varre vassourinha, / Varre, varre a bandalheira / Que o povo já está cansado / De sofrer dessa maneira / Jânio Quadros é esperança / Desse povo abandonado…”. Ousa no site Youtube.
Além de seus predicados políticos, Jânio fazia questão de falar a língua do povo. Criou uma forma única de fazer política. Andava com os cabelos desgrenhados e, no meio do povo, retirava um pão com mortadela do bolso e começava a comer. Diziam até que ele jogava algum tipo de pó nos ombros para transparecer que tinha caspa.
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A disputa principal era contra o candidato apoiado pelo governo anterior, o Marechal Lott. Entretanto, Juscelino não conseguiu transferir para seu escolhido o carisma que o levou a presidência. Ao final, a vassoura de Jânio venceu a espada de Lott, com 5.636.623 (48,26%) votos a 3.846.825 (32,94%). Completando o pleito tivemos o paulista Adhemar de Barros, com 2.195.709 (18,79%).
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Como eram eleições desvinculadas, ou seja, votava-se para presidente e para vice separadamente, venceu o movimento Jan-Jan, Jânio Quadros e João Goulart (Jango).
Presidência
Enquanto presidente, Jânio foi uma sucessão de contradições. Afirmou que resolveria os problemas do país, mas sua política econômica de extrema austeridade não surtiu efeito.
No campo ideológico se dizia anticomunista, mas reatou as relações com a União Soviética, cortadas após a 2° Guerra Mundial. Além disso, enviou seu vice-presidente a uma visita a China, outro país comunista, e criticou duramente a política norte americana em relação a Cuba. Para concluir, condecorou Chê Guevara com a Ordem do Cruzeiro do Sul, maior honraria que alguém pode receber de nosso governo. Chê, dois anos antes, havia liderado a Revolução Cubana e instaurado, próximo aos EUA, um governo comunista (tema em nosso blog). Outro condecorado foi o cosmonauta soviético Yuri Gagarin.
A ideia de Jânio era interessante, abrir novos mercados consumidores para os produtos brasileiros. Ele tentou fazer uma política externa independente das pressões advindas da Guerra Fria. O detalhe é que, naquele momento, era difícil não escolher um lado, ainda mais o Brasil estando localizado na América do Sul, quintal yankee. Seus atos desagradaram profundamente setores conservadores da sociedade e políticos de direita, além das forças armadas, alinhadas com os norte-americanos. Dentro da própria UDN, partido forte de sua aliança política, estavam incomodados com a situação.
Seu mandato se notabilizou por apresentar leis de pouca relevância, como as proibições de brigas de galo, lança perfume e, pasmem, do biquíni.
Renúncia
Completamente isolado, coube a Jânio renunciar, no dia 25 de agosto de 1961. Especula-se que ele tenha tentado uma grande manobra. Com a iminente intervenção militar em seu governo, a ideia era renunciar, esperando que o povo fosse as ruas pedindo seu retorno. Voltando nos braços da população, ficaria difícil qualquer ação contra ele. Até mesmo o momento da renúncia corrobora esta teoria, já que seu vice estava em viagem a China, não podendo assumir imediatamente. Jânio esperava que neste meio tempo, um forte apoio não permitiria sua saída.
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O detalhe é que, com medidas econômicas inócuas, leis estapafúrdias e uma aproximação com países comunistas, seu pedido de renúncia foi aceito pelo congresso ficou por isso mesmo.
Vejam parte de sua carta de renúncia:
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- “Fui vencido pela reação e, assim, deixo o Governo. Nestes sete meses, cumpri meu dever. Tenho-o cumprido, dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções nem rancores. Mas, baldaram-se os meus esforços para conduzir esta Nação pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, o único que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo.
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- Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou indivíduos, inclusive, do exterior. Forças terríveis levantam-se contra mim, e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração…”
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Jânio alegou que a pressão de “forças terríveis” o obrigava a renunciar, mas em momento algum da história ele definiu quais eram estas forças. Leia mais no site do canal History.
Concluindo, é importante frisar que, apesar de excêntrico, em nenhum momento foi descoberto qualquer mácula na integridade de Jânio Quadros, que voltou a vida pública em 1985, sendo eleito prefeito de São Paulo. Mais uma vez deu seu show particular, proibindo uso de sunga em jogos e biquínis fio dental no Parque do Ibirapuera. Aplicou multas de trânsito pessoalmente e fechou 8 cinemas que iriam passar os filme “A última tentação de Cristo”.
Para conhecer melhor este ícone de nossa história, falecido em fevereiro de 1992 (75 anos), veja esta entrevista para a TV Tupi, reproduzida no site Youtube.
Próximo texto
Nosso próximo post irá abordar o governo que assumiu após a renúncia de Jânio. Por incrível que pareça, foi ainda mais agitado que o anterior, culminando com o dia que durou 21 anos. Imperdível.
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Publicado em 04.05.2017
Bom… Pra mim o episódio mais efêmero e exótico, da nossa história política não foi o mandato de Jânio. Pelo menos ele foi eleito, da mesma forma como Collor seria eleito (só trocar vassourinha por caçador de marajás).
O episódio mais efêmero e exótico foi a eleição de Tancredo, por um colégio eleitoral quando o povo queria diretas.
Aliás, os brasileiros gostam de “salvadores da pátria” os descartam com golpes e eleições malucas. (os paulistas são especialistas no assunto).
Quanto ao governo do Jânio, foi copiado pelo bago roxo em tudo.
Jânio achou que teria o apoio do Congresso (a população ele pensava ter controle via imprensa). O Congresso que tinha gente como Tancredo, deu uma bela duma rasteira nele… Tem vários livros que contam esta história com uma riqueza de detalhes impressionante. Adelaide Carraro, Carlos Castello Branco, Marechal José Machado Lopes e Mário Vítor são alguns dos autores. Jânio foi, IMNSHO, um Collor melhorado … nada além disso.